Agora a pouco acabo de assistir a uma reportagem na TV que, confesso, deixou-me perplexo. Um carro que é fabricado aqui, repito, aqui no Brasil, custa em média vinte mil reais a menos em países que o recebem, como Argentina e México. A reportagem do jornal televisivo tentava explicar a causa disso. Um consultor afirmava que era porque o brasileiro tem renda melhor, no que foi prontamente desmentido por um comentarista televisivo. A conclusão final foi que o automóvel brasileiro é um dos mais caros do mundo por conta dos elevados impostos. Ou seja, por conta daquele dinheiro (ou melhor, de uma das muitas fontes dele) que vai para financiar os mensalões, as viagens do presidente e sua vasta comitiva, as centenas de ministros inúteis, a empresa do filho do presidente, os governadores e prefeitos corruptos de todos os partidos, etc., etc.
Mas adiciono mais duas causas:
1- O consumismo do brasileiro, o maior consumista do mundo (superando os estadunidenses, que consomem porque podem, excetuando a mania de hipotecas imobiliárias deles). Geralmente é típico do brasileiro se pendurar em dívidas escabrosas em diversos cartões de créditos. Pagar vultosas quantias em restaurantes de luxo (ou não) com comida de qualidade duvidosa. É também típico dar dinheiro às montadoras, que batem recordes de venda em cima de recordes, com seus automóveis a preços imorais. Tem que ter carro e ponto, custe o quanto custar. Isso ajudou o preço das carroças a subir estratosfericamente, enquanto as ruas paradoxalmente se entulham de congestionamentos. Sinceramente, não consigo entender esse comportamento. Seria histeria coletiva? Comprei uma S-10 cabine dupla diesel, zerada, em 1999, por R$ 38.700,00 (tenho a nota fiscal até hoje), conforme insinuei em outra postagem. Se minha renda subisse o preço que ela subiu, entraria para os 99,99% de iludidos (ou cegos) que batem no peito e afirmam que a economia brasileira vai bem e não há inflação. Se vai bem, por que vejo sempre propagandas dizendo “compre logo o seu carro zero antes do próximo aumento”? Se vai bem, por que será que o ovo da páscoa (outra mania inútil de jogar dinheiro fora) ou o panetone de cada ano é sempre bem mais caro do que o do ano que passou? Se vai bem, por que será que tenho a impressão de que toda vez que o salário mínimo sobe diminui o número de funcionários em lojas e supermercados? Se vai bem, por que os laticínios subiram cerca de 300% em poucos anos (antes da falaciosa alta de preços mundial de alimentos)? Excesso de consumo somente? Ilusão de financiamentos parcelados até a morte com aquela taxazinha de juros sem vergonha? Sinceramente, não creio que seja só isso, mas uma boa dose de maquiagem estatística somada a um comportamento social de rebanho. Ao cérebro é mais fácil lidar com a idéia de que tudo vai bem. O que interessa para mim é que meu poder aquisitivo vem se esfacelando progressivamente. Talvez seja só o meu. Talvez seja só uma paranóia minha, do alto dos meus 45 anos, vendo as estradas da vida se estreitarem cada vez mais...
2- A segunda causa é a falta de investimentos no setor de transportes coletivos. Eles são sujos, desconfortáveis, poucos, caros e padecem do efeito “falso Robin Hood”: o trabalhador miserável paga a passagem na íntegra. Mas certos grupos, não. Não me levem a mal, mas até os empresários paulistas foram taxativos ao declarar na Folha de São Paulo que não existem meias em ingressos nem passagens. O que existe é que quem não tem carteirinha paga o dobro. E a maioria das pessoas que tem carteirinha não precisa comprovar renda familiar, o que seria o certo. Exceto uma parcela de estudantes menos favorecidos, não deveriam ter o seu cinema “patricesco” de shopping financiado pelo dinheiro do pobre trabalhador. Aqui em Salvador, possivelmente, temos o pior e mais caro transporte coletivo do país. Além de tudo, há a insegurança, com mortes e assaltos em coletivos, já que estamos largados às baratas em termos de segurança pública. Pelo visto, estamos numa situação sem fim.
É hora de mudar.
-
Sem medo de dar grandes passos, afinal não se pode atravessar um abismo com
dois pulinhos.
Há 12 anos
6 comentários:
Concordo plenamente. O bom dos comentários é que voce nao se preocupa com melindres e com panos quentes.
Valeu Jânio. Sei que muita gente pode achar exagerado o que escrevi quanto às meias. Mas quem contestar que o faça com embasamento. Acho que meia deveria ser para pobre. E não para abonados que se fazem de coitadinhos enquanto os pais lhes dão os olhos da cara.
É impressionante como se tenta arrumar desculpa para tudo no Brasil. Quando o Sr. Cita a reportagem, chega a ser cômica a tentativa de justificar a diferença de preços. E sobre as meias, gostei ainda mais do seu comentário acima “Acho que meia deveria ser para pobre. E não para abonados que se fazem de coitadinhos enquanto os pais lhes dão os olhos da cara.”
É verdade. E o pior, LIvi, é que ninguém se aprofunda no assunto nem são tomadas providências.
Estava vendo hoje uma reportagem antiga sobre a "lavanderia nordeste", mostrando a quantidade de dinheiro que foi enviada pelo exterior por nomes conhecidos e em atividade na política brasileira, a exemplo Inocêncio Oliveira, vastamente citado. Existem provas cabais desse e das outras dezenas de esquemas de corrupção. O que me chocou não foi a corrupção em si, mas sim a quantidade de informações, e documentos que se tem para provar tais práticas. Até encaminhamento à Procuradoria Geral da República já houve, mas não há progresso algum. Infelizmente qualquer luta aparenta ser uma causa perdida. Se acostumar a isso é difícil, como o senhor disse, "ninguém se aprofunda no assunto nem são tomadas providência".
Pode notar uma coisa, caro Livi. Basta uma cidadezinha ter um prefeito um pouquinho honesto que ela melhora bastante. Imaginem se em todas as cidades tivéssemos prefeitos melhores. O povo saberia quem colocar como prefeito (e por conseguinte como deputado, senador, governador, presidente, etc.) ou se revoltaria pela falta de favorecimento individual?
Postar um comentário